Investidor reavalia Bolsa diante das pressões de juros, inflação e crise política

                                                                           Foto: Reprodução                                                                                                                                                                                                                                                                

 

 

Nos últimos meses, o Brasil viu o cenário econômico mudar rapidamente. Em pouco tempo, o país saiu de um ambiente de juros mais baixos da história para uma escalada de preços e sucessivas elevações da Selic.

Segundo economistas ouvidos pela Folha, a nova conjuntura favorece a renda fixa e a tendência é que investidores aumentem o percentual desses ativos em suas carteiras nos próximos meses.

A taxa básica, que hoje está em 5,25% ao ano, começou o ano em seu menor nível, a 2%, e deve terminar acima de 7%.

Na mesma direção, a intensa instabilidade política e fiscal vivida no país e incertezas quanto à retomada jogam contra a renda variável, que é extremamente sensível a esses ruídos. O quadro deve se agravar até as eleições de 2022.

Em momentos de turbulência no mercado financeiro, historicamente os investidores buscam aplicações mais seguras, com baixa volatilidade.

Com isso, títulos do Tesouro, por exemplo, ganharam tração, porque, além de serem ativos seguros, passaram a remunerar mais.

Em junho, quando a Selic foi a 4,25%, o estoque de títulos públicos alcançou R$ 66,35 bilhões, aumento de 2,1% em relação ao mesmo período de 2020.

Aplicações de renda fixa haviam perdido atratividade após o ciclo de baixa da Selic, quando investidores migraram para a Bolsa em busca de maior retorno financeiro.

Em 2020, o número investidores quase dobrou. A B3 (Bolsa de Valores brasileira) superou 3 milhões de CPFs cadastrados. Atualmente, são 3,86 milhões de contas.

Segundo Bernardo Pascowitch, presidente do buscador de investimentos Yubb, as pesquisas na plataforma já mostram inversão desse movimento.

“Percebemos o aumento da procura por renda fixa e uma diminuição de interesse por renda variável, no nosso sistema. Isso reflete a busca por ativos menos voláteis”, afirma Pascowitch.

O executivo diz, contudo, que mesmo com a alta da Selic, muitos produtos de renda fixa ainda não superam a expectativa de inflação para 2021, que está em 6,79%, segundo o boletim Focus do Banco Central.

“Acredito que muitos devem aumentar o percentual desses ativos na carteira para reduzirem o risco, mas entendendo que talvez percam para a inflação. Alguns títulos do Tesouro, como os pós-fixados, ficaram mais atrativos, mas no fim do dia é preciso diversificar”, afirma.

Pascowitch pondera que outros ativos de renda variável podem ser interessantes para quem quer reduzir o risco.

“É importante dolarizar a carteira para se proteger em momentos de oscilação da moeda americana. Existem fundos, BDRs [recibos de ações estrangeira] ou papéis em outros países”, diz.

Stefan Castro, gestor de renda fixa da AF Invest, reforça a necessidade de diversificar a carteira de investimentos.

“Em renda fixa, vemos boas oportunidades em títulos corporativos, que têm rentabilidade atrativa. Além disso, saúde financeira das empresas no geral está boa”, sugere. Segundo ele, títulos atrelados à inflação e pós-fixados também estão em alta.

O diretor de estratégia da empresa de análise econômica Inversa, Rodrigo Natali, alerta que muitos investidores não entendem o risco real de seus investimentos. “Alguns dos entrantes não mensuraram corretamente o risco. Quando as coisas vão bem, você acha que não tem como perder [dinheiro], mas não é bem assim”, afirma.

“Nesses casos [de queda das ações] existem dois perfis, os que saem da renda variável e os que percebem que deveriam ter estudado mais para saber lidar com cenários de adversidade”, afirma Natali.

O analista diz acreditar que a tendência é que os riscos políticos e fiscais se intensifiquem até a eleição de 2022. “Imaginávamos que a corrida eleitoral começasse no fim do ano, mas foi antecipada. Com isso, as turbulências vindas desse cenário devem aumentar”, afirma.

Na visão de Gabriel Mallet, especialista em renda fixa da Vitreo, ainda há espaço para que recursos da poupança migrem para produtos mais rentáveis.

“Essa sempre foi uma briga do mercado, é um problema de educação financeira do brasileiro. As pessoas não fazem a conta [de rendimento]. Títulos do Tesouro, por exemplo, rendem mais com a mesma liquidez [facilidade em reverter o papel em dinheiro] e segurança”, diz.

Com a pandemia e o pagamento do auxílio emergencial, o saldo da poupança alcançou R$ 1 trilhão em setembro do ano passado, segundo dados do BC, e permanece no patamar até hoje.

Após a chegada do vírus ao país, em março do ano passado, a caderneta registrou valores elevados em captação líquida nos meses seguintes, em comparação ao restante da série.

O benefício do governo é pago por meio de conta-poupança digital da Caixa Econômica Federal, o que ajudou a explicar o movimento de forte alta na captação líquida ao longo de 2020, que bateu recorde com R$ 166,3 bilhões de entradas líquidas.

“O brasileiro ficou mal-acostumado ganhando a juros de 12% a 14% sem risco, isso é irreal. Com a queda [da Selic], o investidor teve de buscar novas oportunidades e viu que risco e retorno andam lado a lado”, diz Mallet.

Com informações de Larissa Barros / Folha de São Paulo

 

 

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