Após Bolsonaro revogar honraria a dois cientistas, 21 renunciam à indicação

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Após o presidente Jair Bolsonaro revogar a homenagem da Ordem Nacional do Mérito Científico a dois cientistas responsáveis por trabalhos que desagradaram ao governo, outros 21 profissionais que seriam agraciados com a honraria decidiram renunciar à indicação em solidariedade aos colegas.

“A homenagem oferecida por um governo federal que não apenas ignora a ciência, mas ativamente boicota as recomendações da epidemiologia e da saúde coletiva, não é condizente com nossas trajetórias científicas. Em solidariedade aos colegas que foram sumariamente excluídos da lista de agraciados, e condizentes com nossa postura ética, renunciamos coletivamente a essa indicação”, diz a carta aberta.

A Ordem Nacional do Mérito Científico é uma honraria concedida todos os anos para homenagear pessoas que se dedicaram ao avanço da ciência no país. A escolha é feita a partir de indicações da área, que são depois votadas por um comitê, que tem nove integrantes: seis indicados pela sociedade civil e pelas universidades e outros três representando o governo.

Em 3 de novembro, um decreto assinado por Bolsonaro concedia a homenagem ao médico sanitarista Marcus Vinícius Guimarães de Lacerda, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), e à médica Adele Benzaken, ex-diretora do Departamento de HIV/Aids do Ministério da Saúde.

Lacerda foi responsável por um dos primeiros estudos a apontarem a ineficácia da cloroquina contra a covid-19. Os medicamentos são receitados dentro do que se convencionou de “tratamento precoce”, embora sejam comprovadamente ineficazes para o combate do novo coronavírus. Bolsonaro é um dos defensores da cloroquina, apesar das evidências científicas contrárias.

Já Adele foi demitida do cargo em janeiro de 2019, após a publicação de uma cartilha sobre prevenção de doenças destinada a homens trans. Ela ocupava a função desde junho de 2016.

Após a repercussão sobre o trabalho feito por Lacerda e Adele, os dois tiveram a homenagem revogada por Bolsonaro. Um novo decreto foi editado em 5 de novembro, apenas dois dias depois do original.

Na carta, divulgada neste sábado, os 21 cientistas declaram sua “indignação, protesto e repúdio pela exclusão arbitrária dos colegas” e veem perseguição aos cientistas. Os signatários atuam em diferentes campos da ciência: biomédica, química, humanas, física, matemática, biológica e da terra. Também há personalidades nacionais.

“Tal exclusão, inaceitável sob todos os aspectos, torna-se ainda mais condenável por ter ocorrido em menos de 48 horas após a publicação inicial, em mais uma clara demonstração de perseguição a cientistas, configurando um novo passo do sistemático ataque à Ciência e Tecnologia por parte do governo vigente”, diz a carta.

No documento, os profissionais criticam ainda o “negacionismo em geral” e os cortes em verbas federais para o desenvolvimento da ciência.

Os cientistas agradeceram às indicações feitas pela Academia Brasileira de Ciências e pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), entidades com assento no comitê que decide as homenagens da Ordem Nacional do Mérito Científico. Eles se dizem “extremamente honrados” com a possibilidade de serem agraciados, mas declinam à indicação devido à exclusão de Lacerda e Adele.

“Esse ato de renúncia, que nos entristece, expressa nossa indignação frente ao processo de destruição do sistema universitário e de Ciência e Tecnologia. Agimos conscientes no intuito de preservar as instituições universitárias e científicas brasileiras, na construção do processo civilizatório no Brasil”, diz a carta.

As informações são do Estadão

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