Uma seguidora de Pablo Marçal (PRTB), candidato à Prefeitura de São Paulo, afirma nas redes sociais ter vencido duas competições de cortes do influenciador no mês de maio, contrariando a versão do empresário de que ele não teria realizado a premiação durante a pré-campanha.
Os cortes são a chave do sucesso de Marçal no meio digital. São vídeos curtos que prendem a atenção e que rapidamente viralizam nas redes, nos quais o influenciador geralmente aparece com alguma fala polêmica ou inusitada.
O empresário já afirmou diversas vezes que promoveu competições para premiar com dinheiro os autores dos cortes com maior engajamento. No mês passado, a Justiça Eleitoral suspendeu seus perfis nas redes por entender que há indícios de que Marçal cometeu abuso de poder econômico ao garantir essa remuneração.
Depois da decisão, o influenciador disse que não promoveu os campeonatos durante a campanha eleitoral, ou mesmo na pré-campanha. Questionado pela Folha se houve premiação desde abril, o candidato negou.
Nas redes sociais, uma mulher chamada Karen Talissa, que diz já ter trabalhado como auxiliar de limpeza e de cozinha no resort de Marçal em 2021, afirma que voltou a publicar vídeos do influenciador no dia 6 de maio deste ano.
Ela diz que ganhou “uma premiação diária e uma premiação mensal da competição dos cortes do Pablo Marçal”, cita o grupo do Discord onde as competições eram promovidas pelo entorno do influenciador e afirma que em sete dias saltou de 4.000 para 190 mil seguidores.
“Em 16 dias fiz mais de 3 mil reais só fazendo cortes!”, escreveu em publicação do dia 30 de maio.
Karen diz que conseguiu viralizar com conteúdos do autodenominado ex-coach em meio às enchentes no Rio Grande do Sul, que ocorreram do final de abril ao início de maio.
Quando a seguidora foi premiada em competição promovida pelo influenciador, conforme ela narra, ele já era citado pela imprensa como pré-candidato à prefeitura. Em abril, o presidente nacional do PRTB, Leonardo Avalanche, afirmou ao Painel que o empresário concorreria pelo partido. A pré-candidatura foi confirmada no mês seguinte.
Questionada pela Folha sobre qual foi a premiação oferecida no grupo do Discord de Marçal em maio, Karen respondeu: “50.000. Para quem obtiver mais visualizações”. Logo em seguida, porém, ela disse que a remuneração é na verdade paga pelas plataformas (empresas como o TikTok e o Instagram).
“Oq paga mesmo são as monetização (sic)”, escreveu. “A competição que ele faz é só pra incentivar mais!”
As plataformas remuneram usuários criadores de conteúdos com altas visualizações, mas não promovem campeonatos de cortes de Marçal em grupos do Discord. O próprio influenciador já admitiu realizar os pagamentos no passado. “Quem tiver mais visualizações eu pago em dinheiro”, afirmou ele em abril ao canal do Youtube Achismos TV.
Karen afirma à reportagem que começou a fazer os cortes em março, mas que só em abril as visualizações passaram a crescer. “Ganhei pelos cortes que já vinha fazendo antes da catástrofe no Rio Grande do Sul!”, respondeu, em contradição com o que ela mesma disse nas redes anteriormente.
Em outro vídeo de Karen, publicado no dia 14 de maio, ela aparece contando para Marçal sobre seu sucesso com os cortes –aparentemente em meio a uma das palestras do influenciador.
Na gravação ela fala que passou a ensinar gratuitamente a viralizar com os vídeos. Hoje, assim como dezenas de pessoas, Karen vende cursos prometendo ganhos financeiros com a produção de cortes de Marçal, monetizados pelas plataformas.
“Pablo, eu sou uma validação do seu método (…) No meu sexto vídeo já viralizou, deu mais de 5 milhões de visualizações. Hoje faz sete dias só que eu tenho TikTok, e eu já ganhei primeiro lugar lá na premiação no Discord”, ela afirma ao empresário.
Marçal responde que ela é “exponencial” e que tinha uma máquina nas mãos com os alunos que até então ensinava sem cobrar. “Agora vai ter que aprender a converter”, disse. O influenciador também se dirigiu a uma pessoa da sua equipe, do setor dos cortes, e pediu para que Karen fosse contratada.
“Diego, quem que mexe com os cortes? Contrata ela aí pra ela dar uma erguida na vida dela.”
Procurada, a campanha de Marçal não retornou contato da Folha.
Durante o programa Roda Viva na segunda-feira (2), Marçal foi questionado novamente sobre pagamentos por cortes e negou. “Antes do período eleitoral, eu já cansei de fazer isso. Dentro da campanha e da pré-campanha não houve”, disse.
Segundo a legislação eleitoral, a propaganda eleitoral na internet pode ser realizada por qualquer pessoa, vedada “a remuneração, a monetização ou a concessão de outra vantagem econômica” como retribuição pela publicação, paga pelo beneficiário do conteúdo ou por terceiros.
Já o abuso de poder econômico é entendido pela Justiça Eleitoral como a utilização excessiva, antes ou durante a campanha eleitoral, de recursos materiais ou humanos que representem valor econômico, buscando beneficiar candidato, partido ou coligação, e assim afetando a normalidade e a legitimidade das eleições.
No fim do mês passado, o site Aos Fatos mostrou outro indício de que a equipe de Marçal teria continuado a realizar pagamentos em período eleitoral.
Em áudio publicado no grupo do Discord dedicado aos cortes, um funcionário do influenciador explica atraso no pagamento da premiação afirmando que uma intermediária emitiria a nota fiscal.
Além disso, o regulamento de competição realizada pela equipe do influenciador entre 24 de junho e 7 de julho obrigava o uso da hashtag “prefeitomarçal”.
Ana Luiza Albuquerque e Artur Rodrigues/Folhapress