O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), disse à Folha que foi fechado um acordo para que o PT indique um representante a uma vaga no TCU (Tribunal de Contas da União).
Isso ocorreu no bojo das negociações para que o partido apoiasse a candidatura de Hugo Motta (Republicanos-PB) à presidência da Câmara, em eleição marcada para fevereiro.
“O PT solicitou a indicação da bancada deles. Eles reclamam que politicamente nunca tiveram um representante no TCU. [Há o compromisso] com o PT, sim, de eles indicarem a vaga”, afirmou.
Com a aposentadoria de dois ministros do tribunal, duas vagas serão abertas até 2027, e a indicação de novos nomes pela Câmara entrou nas negociações.
Lira falou à reportagem na noite de quarta-feira (30), horas após o PT de Lula e o PL de Jair Bolsonaro anunciarem apoio ao nome de seu candidato na disputa.
Como o sr. avalia a sua condução no processo para escolher um candidato para sua sucessão?
Procurei trabalhar o tempo todo para construir uma candidatura que unificasse, que pudesse convergir. Fui com muito cuidado e sensibilidade, porque a princípio tinham três candidatos, que votaram comigo duas vezes com retidão, com anos de parceria.
Nunca falei com ninguém a respeito de quem era o nome, porque estava em construção. O líder Elmar [Nascimento] é amigo? É. Se pudesse votar sozinho, talvez fosse ele. Mas isso faz parte de uma construção partidária, de uma Casa plural.
Num momento, ficou claro que a Casa queria uma oportunidade de ter um candidato mais do meio. Durmo com tranquilidade de que tudo que está acontecendo é fruto de muita confiança entre partidos e deputados, que vão amadurecendo para saber diferenciar a luta administrativa dentro da Casa das lutas ideológica por pautas e por bandeiras no plenário.
É possível atrair o PSD e o União Brasil?
Fiz questão de me referir ao [Antonio] Brito e ao Elmar, além de parceiros, como amigos de vida. Há essa preocupação de estar todo mundo atendido. Vou trabalhar muito para terminar essa jornada com todos os partidos organizados e continuar conversando. Tem tempo e tem espaço.
Elmar está muito chateado, falando em traição e deslealdade. Como vê isso?
Tudo tem que ter um tempo a maturar. Vou trabalhar 24 horas para que isso seja superado. Mantenho o meu sentimento por ele de muita amizade.
A política fala em “Elmar, homem-bomba”. Existe alguma bomba?
Absolutamente nenhuma.
O que entrou no acordo para o PT apoiar Hugo Motta?
A minha relação com o presidente Lula e com o PT não é antiga. Mas a minha relação dentro da Casa com os deputados dos partidos é antiga. Conheci pessoalmente o presidente após a eleição dele, aqui nesta Casa. Toda a nossa conversa a partir daí se confirmou através de ações corretas e apoio ao governo naquilo que assumimos.
Em todas as oportunidades que o presidente Lula pôde falar, disse que eu teria a preferência de conduzir a minha sucessão. Sempre tivemos conversa boa. Da mesma forma como eu mantenho com o ex-presidente [Jair] Bolsonaro. O PL e o PT estão no bloco majoritário e vão ficar juntos no mesmo bloco agora da segunda mesa.
A gente sabe que sempre tem negociações de interesses dos partidos…
As negociações são administrativas. Espaços na mesa, nas comissões, as relatorias. E muitos partidos trazem pautas.
A vaga do TCU entrou no acordo com o PT?
Acho que é lícito, mas [ainda] não tem a vaga. Se houver, o PT solicitou, sim, a indicação da bancada deles. Eles reclamam politicamente que nunca tiveram um representante no TCU e, quando tiveram candidatos, não tiveram êxito no plenário, que é a segunda etapa.
Mas houve um compromisso?
Com o PT, sim. De eles indicarem a vaga no TCU.
Como se deu a costura para o sr. anunciar a criação da comissão especial para analisar o PL da Anistia?
O projeto estava sendo inapropriadamente usado para eleição na Mesa. A vontade do que vai ou não votar é da Casa, não do presidente [da Câmara]. Um tema sensível como esse, por tudo que aconteceu, por tudo que está acontecendo, estava sendo usado inapropriadamente. Conversei tanto com um partido quanto com outro. Nós vamos dar a solução para isso dentro do meu mandato, conversando e ouvindo muito, como sempre faço.
O que falta para resolver o imbróglio das emendas parlamentares?
O acordo existe entre Câmara, Senado e governo. Há um sentimento de preocupação com universidades e hospitais precisando de recursos, com obras paralisadas.
Fala-se até hoje de ‘orçamento secreto’. Para mim, é muito pior o ano de 2023 do que o de 2022, o de 2021. Nem vocês sabem como foi feita a programação dos ministérios, com relação à origem de indicação, de quem é e como é. Nesse momento, Executivo, Senado e Câmara estão alinhados no texto que estão propondo.
Há um prazo para essa definição?
Esperava ter votado nesta semana. Todos os partidos estão reclamando da paralisação.
Líderes dizem que o sr. é um crítico da interferência de Poderes. Esse caso é um exemplo?
A sobreposição de um Poder sobre o outro, seja ele qual for, é muito ruim. E a Câmara nunca se sobrepôs nem ao Executivo, nem ao Senado, nem ao Supremo. Sempre prezei por muito equilíbrio. E quem preza por equilíbrio não gosta quando o jogo desequilibra. Não estou dizendo que A, B ou C estão desequilibrando.
A PEC das decisões monocráticas vai andar na Câmara?
Não tive nenhuma reunião de líderes ainda para discutir isso. Mas há um sentimento muito grande no Congresso, da esquerda, do centro e da direita, de que atos monocráticos contra deliberações do Congresso possam ser modulados.
O sr. acha que o resultado das eleições municipais, com crescimento do centro e da direita, deve impulsionar uma reforma ministerial no governo?
Na minha visão, eleição municipal é uma coisa, eleição nacional é outra.
Mas algum recado se tira desse resultado.
Sim, que o Brasil é um país mais conservador, de centro-direita. O que é o retrato do país? Um país de centro-direita no Parlamento e um governo progressista, no Executivo, o que obriga convergência de trabalho, de discussão, de construção.
O sr. acha que deve ter mais espaço para partidos de centro numa eventual reforma?
Não é mais espaço. O PP não está pleiteando nada. Acho até que, para o que o PP contribuiu com a presidência da Câmara, eu sou do partido, com as votações que apoiou e votos que deu, nós temos muito menos participação do que outros partidos. Quem tem que fazer essa avaliação, se está bom, se está ruim, se precisa melhorar, que rumos dar, é o governo. O governo é do presidente Lula.
Em várias oportunidades o sr. foi colocado como alguém truculento. Como avalia essa crítica? E o sr. faz alguma autocrítica?
A política criou um estereótipo de que político bom é aquele que dá tapinha nas costas, ri e só diz o que as pessoas querem ouvir. Eu faço política há 34 anos, nunca mudei a minha maneira de ser com relação às pessoas. Sou duro, carinhoso ou amigo quando tem que ser. Não minto, não blefo, faço a política reta, e as pessoas talvez gostem. Não conheço um truculento que teve 464 votos numa reeleição. Estereótipos são criados, mas não me acho assim tão truculento, não.
Raio-X Arthur Lira, 55
Deputado federal por Alagoas, está no quarto mandato. Foi eleito presidente da Câmara em fevereiro de 2021 e reeleito em 2023. Antes, foi vereador em Maceió por duas legislaturas e deputado estadual por três. Filiado ao PP desde 2009, passou antes por PFL, PSDB, PTB e PMN.
Camila Mattoso e Victoria Azevedo/Folhapress