Mencionado em relatório do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) por supostas movimentações financeiras atípicas, o ministro do STJ (Superior Tribunal de Justiça) Paulo Moura Ribeiro nega que tenha feito transações ilícitas.
Ele atribui as desconfianças aos valores que recebeu em aulas e palestras e a pagamentos na reforma de um imóvel da família.
O levantamento do Coaf que menciona Moura Ribeiro foi incluído em inquérito remetido pela Polícia Federal ao STF (Supremo Tribunal Federal) que trata de suspeitas de vendas de sentença no STJ. O caso e a menção ao ministro foram revelados pela revista Veja.
Segundo a publicação, inicialmente os investigadores apuravam apenas eventuais irregularidades cometidas por funcionários de gabinetes, mas o caso foi enviado ao Supremo após o documento do Coaf citar Moura Ribeiro.
Em manifestação à Folha, o ministro afirmou que “sobre as movimentações financeiras não usuais, eu ministro aulas, dou palestras e, recentemente, suportei e estou suportando os custos de uma reforma de um imóvel da minha família, o que poderia ser considerado atípico”.
“Já movimentações ilícitas, jamais as tive”, diz Moura Ribeiro.
“Fiquei extremamente indignado em ver meu nome veiculado na imprensa por supostas ‘movimentações não usuais de valores’ em uma apuração que está sendo feita pelo Coaf. Eu tenho 41 anos de magistratura e ensino jurídico, sem nunca ter sido acusado de desvio de conduta”, afirma.
“Sempre pautei minha vida pela verdade e pela ética profissional. Por outro lado, fico extremamente triste em saber da possibilidade de envolvimento de servidores do STJ em ‘venda de decisões’. Tenho certeza que as investigações darão as respostas necessárias e, no fim, a justiça vai prevalecer.”
Ser citado em um relatório do Coaf não significa que houve um crime, mas pode ser usado como elemento de investigações.
As investigações que chegaram nas suspeitas sobre o STJ se iniciaram após o homicídio de um advogado em dezembro do ano passado, em Mato Grosso. O caso levou ao afastamento de dois desembargadores do Tribunal de Justiça do estado pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça).
O advogado Roberto Zampieri foi assassinado com dez tiros em dezembro passado. Na ocasião, ele estava dentro do carro, em frente ao seu escritório na capital mato-grossense. Em seu celular, havia mensagens que levantaram suspeitas de vendas de decisões por gabinetes de quatro ministros do STJ.
As investigações iniciais apontavam como uma das motivações processos de disputas de terras que tramitam no Tribunal de Justiça de Mato Grosso.
As desconfianças sobre vendas de decisões começaram a partir de decisões tomadas por um juiz de Cuiabá na condução da apuração, e o CNJ interveio no caso para evitar a possibilidade de destruição de provas.
O então juiz da 12ª Vara Criminal de Cuiabá Wladymir Perri havia determinado que qualquer material entregue à polícia sobre o caso deveria ser protocolado de forma física na vara.
Depois que esses documentos chegaram, relatou o Ministério Público de Mato Grosso ao CNJ, o juiz deslacrou os envelopes que continham uma HD com os dados de celular e da agenda da vítima.
Até aquele momento não havia uma análise da polícia sobre os dados contidos nesse material. “[O juiz fez isso] sem qualquer provocação das partes, tampouco designação de ato que pudesse ser acompanhado/fiscalizado pelas partes”, disse o MP-MT.
O juiz ainda perguntou à época à polícia, “sem motivo aparente”, se havia na investigação eventual citação de autoridades com foro especial. Congressistas, como deputados e senadores, secretários de estado e magistrados possuem direito ao foro especial.
O caso chegou em maio à corregedoria do CNJ, que à época estava sob o comando do ministro do STJ Luis Felipe Salomão.
Em 17 de maio, a corregedoria ordenou que todo o material apreendido pela polícia fosse encaminhado ao órgão e que o juiz fosse impedido de dar qualquer decisão a respeito do material.
Também determinou que a extração das cópias que seriam encaminhadas para a Corregedoria Nacional de Justiça tinham que ser acompanhadas por autoridade da Delegacia de Homicídio e Proteção à Pessoa de Cuiabá, para que fosse atestada “a integridade do conteúdo extraído em relação àquele entregue pela Polícia Judiciária à unidade judicial”.
Segundo o CNJ, ele fez diversas remarcações injustificadas de audiências, que ocasionaram a paralisação de processos.
Em agosto, dois desembargadores foram afastados do tribunal, por unanimidade, pelo CNJ. Sebastião de Moraes Filho e João Ferreira Filho, segundo o conselho, são suspeitos de ter recebido vantagens financeiras para julgarem processos de acordo com os interesses de Zampieri.
Antes do afastamento dos desembargadores, o TJ-MT foi questionado sobre as menções à suposta influência do advogado Zampieri na cúpula da corte, mas não se manifestou.
Após o afastamento, o tribunal foi procurado pela reportagem novamente, mas não se manifestou.
A Folha procurou o juiz Wladymir Perri por meio da assessoria do tribunal, também antes dos afastamentos, mas ele não se posicionou. A reportagem não localizou a defesa dos desembargadores. Também procurado, o CNJ não se manifestou sobre o caso.
Em entrevista ao jornal O Globo, o presidente do STJ, Herman Benjamin, disse que foram identificados indícios de venda de decisões em relação a um servidor, que foi afastado. Segundo ele, foi aberto um processo administrativo disciplinar sobre o caso.
José Marques e Alex Sabino, Folhapress