Lula ficou com presentes de luxo: relógios Cartier e Piaget, além de colar de ouro branco

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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ficou com relógios de luxo e um colar de ouro branco que ganhou de presente em seu primeiro mandato. Os itens foram incorporados ao acervo pessoal do petista quando ele deixou o cargo.

Em 2016, a lista de presentes dados a Lula foi alvo de um processo no Tribunal de Contas da União (TCU) e de uma ação da Lava Jato. Na época, a Corte determinou que o então ex-presidente devolvesse a maior parte do que levou consigo. No total, Lula restituiu 453 itens avaliados em R$ 2,258 milhões, entre esculturas, quadros, tapetes, vasos e louças. Já no âmbito da Lava Jato foram devolvidos 21 bens considerados valiosos. O Estadão identificou, no entanto, que alguns objetos de luxo permaneceram no acervo pessoal de Lula e não foram destinados à União.

Em nota, a Presidência da República afirmou que não há irregularidades e que o presidente não vendeu nenhum dos presidentes que recebeu.

Segundo registros do acervo privado do petista e declarações públicas, permaneceram com Lula pelo menos dois relógios de luxo. Um deles, um Piaget avaliado em R$ 80 mil, sequer consta na lista de presentes oficiais. O petista já explicou que o relógio da marca suíça ficou perdido por um tempo e que o encontrou depois em uma gaveta. Ele passou a usá-lo e, inclusive, posou para fotos com o modelo em 2022.

O outro relógio se trata de um Cartier Santos Dumont, feito de ouro branco 18 quilates e prata 750, e com uma coroa arrematada com uma pedra safira azul. É um dos modelos mais clássicos da marca francesa. O Estadão localizou o mesmo modelo de relógio à venda no site Jewellery Discovery por 9.650 libras esterlinas (£), o equivalente a R$ 59,9 mil na cotação atual. Responsável pelo patrimônio do petista, o Instituto Lula informou que o Cartier também está sendo usado pelo presidente da República.

Tanto o Cartier quanto o Piaget foram presentes do governo da França em 2005.

O acervo privado do petista traz ainda um relógio suíço folheado em prata. O mostrador do item tem uma imagem do coronel Muammar Kadafi, antigo ditador da Líbia. Não há detalhes sobre a marca nem o modelo do relógio. O presente foi entregue em janeiro de 2003 pelo então ministro das Relações Exteriores da Líbia, Abdelrahman Shalqam.

Além desses três relógios, Lula ficou com um colar de ouro branco entregue em abril de 2004 pela Citic Group Corporation, uma empresa de investimento estatal da China. A joia traz detalhes em ouro amarelo e possui um pingente no formato de uma gravata.

Auditoria

Quando julgou o processo de Lula em 2016, o TCU estabeleceu que presentes considerados de caráter personalíssimo poderiam ficar com o ex-presidente. A regra passou a servir de base para os próximos mandatários.

A Corte de Contas entende, no entanto, que objetos de grande valor devem ser restituídos ao Estado brasileiro. É justamente esse argumento que vem sendo usado pelo TCU para cobrar do ex-presidente Jair Bolsonaro que devolva os presentes valiosos que recebeu enquanto estava no exercício do cargo e tentou vender.

Bolsonaro, Michelle e Mauro Cid são alvos da Polícia Federal no âmbito da Operação Lucas 12:2, que apura a venda de joias desviadas da Presidência da República. Segundo a PF, teriam sido comercializados anéis, abotoaduras e esculturas de luxo, um barco e uma palmeira dourados, além de um relógio da marca suíça Patek Philippe pelo grupo. Estima-se que o esquema tenha rendido R$ 1 milhão. A apuração surgiu a partir de reportagem do Estadão, que revelou a entrada ilegal de joias sauditas no Aeroporto de Guarulhos pela comitiva do ex-ministro de Minas e Energia almirante Bento Albuquerque.

No caso de Lula, o TCU constatou que até aquele momento havia interpretação equivocada da Presidência da República sobre a legislação que dispõe sobre a preservação, organização e proteção dos acervos documentais privados dos presidentes da República.

O tribunal fixou, então, o seguinte entendimento: “Não só os documentos bibliográficos e museológicos, recebidos em eventos formalmente denominados de ‘cerimônias de troca de presentes’, devem ser excluídos do rol de acervos documentais privados dos presidentes da República, mas, também, todos os presentes, da mesma natureza, recebidos nas audiências da referida autoridade com outros chefes de estado ou de governo, independentemente do nome dado ao evento pelos cerimoniais e o local que aconteceram”.

A exceção, segundo o TCU, refere-se aos itens de natureza personalíssima (medalhas personalizadas e grã-colar) ou de consumo direto pelo presidente da República (bonés, camisetas, gravata, chinelo, perfumes, entre outros).

Durante o seu voto, o ministro Walton Alencar, relator do processo, ainda alertou para o valor dos bens. “Imagine-se, a propósito, a situação de um chefe de governo presentear o presidente da República do Brasil com uma grande esmeralda de valor inestimável, ou um quadro valioso. Não é razoável pretender que, a partir do título da cerimônia, os presentes, valiosos ou não, possam incorporar-se ao patrimônio privado do presidente da República, uma vez que ele os recebe nesta pública qualidade”, disse.

O processo foi arquivado e considerado concluído após a devolução dos presentes. O TCU não localizou oito presentes de Lula, no valor de R$ 11,7 mil, mas o valor se mostrou irrelevante. Cinco dos seis ministros presentes na sessão do TCU em 2016 que determinou a devolução de parte dos bens de Lula permanecem no tribunal.

Ministros de Bolsonaro

Em março deste ano, o TCU notificou a Secretaria-Geral da Presidência da República sobre a necessidade de ex-ministros de Bolsonaro devolverem relógios de luxo recebidos durante uma viagem oficial a Doha, no Catar, em 2019.

Relator do processo, o ministro Antonio Anastasia afirmou que o recebimento de presentes caros extrapola os “princípios da razoabilidade e da moralidade” pública, previstos na Constituição.

Os relógios recebidos pelos ex-ministros Onyx Lorenzoni (Casa Civil), Augusto Heleno (GSI), Ernesto Araújo (Relações Exteriores) e Osmar Terra (Cidadania), segundo a representação feita ao TCU, tinham valor de até R$ 53 mil. As autoridades foram presenteadas com marcas Hublot e Cartier.

Presidência diz que não irregularidades

Procurada para se manifestar, a Secretaria de Comunicação (Secom) da Presidência da República informou que os itens do acervo dos mandatos anteriores foram analisados pelo TCU e pela Operação Lava Jato em 2016. A Pasta explicou que houve uma mudança de entendimento e o que foi determinado a devolução, foi devolvido.

“O que ficou sob responsabilidade da guarda do presidente Lula está no seu acervo, guardado. Nada foi vendido nem se tentou vender nada”, esclareceu. “Nesse sentido, respondendo o pedido do jornal de se manifestar sobre a reportagem, parece uma tentativa de confundir alhos com bugalhos para dar combustível a narrativas políticas equivocadas sobre situações distintas com objetivo de gerar desinformação, nascida talvez do inconformismo e preconceito do jornal com a origem social do presidente, por isso o foco nesses objetos, que de resto seguem as mesmas regras de todos os outros”, diz a nota.

A Pasta voltou a afirmar que todo o acervo dos mandatos anteriores de Lula foi investigado e nenhuma irregularidade foi encontrada. “O atual presidente não vendeu em nenhum momento objetos do seu acervo de mandatos encerrados faz mais de 12 anos.”

Tácio Lorran/Estadão Conteúdo

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