Faltando pouco mais de um mês para deixar a Presidência, Jair Bolsonaro (PL) perderá o foro privilegiado e correrá o risco de ser julgado e preso por supostos crimes cometidos no cargo. Enquanto seus filhos pedem cidadania italiana, aliados do chefe do Executivo desejam emplacar uma emenda constitucional que converta ex-presidentes em senadores vitalícios, com foro privilegiado permanente.
Sobre uma possível anistia a Bolsonaro concedida pelo presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Edinho Silva, um dos coordenadores de da campanha do petista, já rechaçou a hipótese e declarou que “isso é da esfera do Ministério Público, Polícia Federal e Judiciário”.
Enquanto o ex-presidente Michel Temer (MDB) e o ex-ministro do STF Marco Aurélio Mello defendem a anistia para “pacificar o Brasil”, cientistas políticos ouvidos pelo UOL avaliam que a Justiça “não pode perder tempo” para julgar Bolsonaro sob pena de “fortalecer a extrema direita”.
Em outro inquérito, Bolsonaro é investigado por interferir na Polícia Federal ao trocar a chefia da instituição para proteger os filhos. O presidente também é investigado por vazar uma investigação sigilosa da PF sobre um suposto ataque hacker ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e por divulgar notícias falsas sobre o processo eleitoral.
O principal inquérito na Corte é o das “milícias digitais”, uma organização criminosa supostamente criada para ameaçar a democracia.
No TSE, um inquérito investiga se Bolsonaro usou a máquina pública para tentar se reeleger ao criar e ampliar programas sociais para atrair o voto de famílias pobres —um pacote estimado em R$ 273 bilhões.
Nesta semana, em uma articulação golpista, o PL entrou com uma ação no TSE para anular parte dos votos do segundo turno. O presidente da corte, Alexandre de Moraes, negou o pedido e multou a coligação de Bolsonaro. Segundo a colunista do UOL Thaís Oyama, o mandatário participou da articulação do relatório golpista, mas ele não foi citado nas punições.
Se Bolsonaro cometeu crimes, por que não caiu? Embora dezenas de pedidos de impeachment tenham sido apresentados, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), não deu prosseguimento a nenhum deles. “Bolsonaro já tem crimes comuns e de responsabilidade cometidos no cargo que são mais do que suficientes para impeachment”, afirma o cientista político da FGV (Fundação Getulio Vargas) Eduardo Grin.
Bolsonaro deve ser anistiado? A partir de janeiro, ele ficará sem foro, e poderá ser julgado como cidadão comum. Sua anistia é defendida pelo ex-presidente Michel Temer, que a oito dias do primeiro turno afirmou que “o ideal seria fazer um grande pacto nacional”.
Ao UOL, o ex-procurador-geral da República Claudio Fonteles disse que “anistiar sob o fundamento de pacificação nacional não tem base”. “A anistia é motivada para a pacificação de confrontos políticos”, diz. “É diferente de fatos imputados a Bolsonaro, que dizem respeitos a crimes comuns.” Ele cita a conduta do ex-ministro da Educação Milton Ribeiro, que pediu demissão após revelação de que ele citou Bolsonaro durante negociações com pastores para direcionamento de verba pública.
Cientista político da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo), Cláudio Couto diz não acreditar “que vão jogar tudo para debaixo do tapete em nome de uma suposta pacificação”. Sem punição, ele sairia mais forte e investiria novamente contra a democracia. A trajetória dele é uma expressão disso: sempre protegido pela imunidade parlamentar”.
Professora de Direito Penal da FGV, Heloisa Estellita explica que as investigações de crimes comuns podem continuar no STF ou ir à primeira instância. “Se entenderem que há conexão entre os fatos envolvendo Bolsonaro e outros suspeitos com foro, ele pode manter o inquérito no STF”, explica. “Os outros vão para a primeira instância.”
Para o ex-ministro Marco Aurélio Mello, o STF deveria desmembrar os inquéritos nos quais Bolsonaro é investigado com outros políticos com foro e, em janeiro, “baixar imediatamente” para a primeira instância.
Uol