Uruguai e Chile condenam fala de Lula a Maduro sobre criação de ‘narrativa’ na Venezuela

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Os presidentes de Uruguai e Chile criticaram nesta terça-feira (30) a fala do líder brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), feita no dia anterior, de que havia “narrativas” sobre a situação política da Venezuela.

Luis Lacalle Pou, do Uruguai, se disse surpreso com a declaração do petista no encontro com o ditador venezuelano, Nicolás Maduro. “Esta reunião [de líderes sul-americanos] foi antecipada, não sei se de forma planejada, por uma bilateral entre Brasil e Venezuela”, disse o centro-direitista durante a cúpula organizada por Lula no Palácio do Itamaraty, em Brasília. “Fiquei surpreso quando foi dito que o que acontece na Venezuela é uma narrativa. Já sabem o que pensamos sobre a Venezuela e o governo da Venezuela”.

O uruguaio disse que, em relação ao país caribenho, o pior a ser feito é “tapar o sol com a mão”. “Se há tantos grupos no mundo tentando mediar para que a democracia seja plena na Venezuela, para que os direitos humanos sejam respeitados e não haja presos políticos, o pior a fazer é tapar o sol com a mão”.

Na mesma toada, o líder do Chile, o esquerdista Gabriel Boric, um crítico da ditadura venezuelana, afirmou ter manifestado uma discrepância em relação à declaração de Lula, “de que o que ocorre na Venezuela em relação aos direitos humanos é uma questão de narrativa”. “Não é uma construção narrativa, é uma realidade”, disse Boric a jornalistas, após a primeira etapa da reunião. “É [uma realidade] séria, e tive a oportunidade de vê-la nos olhos e na dor de centenas de milhares de venezuelanos que vêm à nossa pátria e que exigem, também, uma posição firme e clara para que os direitos humanos sejam respeitados sempre e em todos lugares, independentemente da cor política do governante de turno”.

Lula realiza nesta terça uma reunião de líderes sul-americanos na tentativa de criar maior integração na região. No dia anterior, o presidente recebeu o ditador venezuelano, Nicolás Maduro, em visita oficial. Na ocasião, disse que as acusações de falta de democracia no país caribenho eram parte de uma “narrativa”.

“Cabe à Venezuela mostrar a sua narrativa para que possa efetivamente fazer as pessoas mudarem de opinião. É preciso que você [Maduro] construa a sua narrativa. E a sua narrativa vai ser infinitamente melhor do que o que eles têm contado contra você. Está nas suas mãos construir a sua narrativa e virar esse jogo, para que a gente possa vencer definitivamente, e a Venezuela, voltar a ser um país soberano, onde somente seu povo, por meio de votação livre, diga quem é que vai governar esse país”, afirmou Lula.

Não é a primeira vez que Lacalle Pou destoa de outros líderes da região, principalmente os que são mais alinhados à esquerda. O presidente uruguaio já criticou o Brasil e a Argentina devido às declarações de líderes de ambos os países contrárias à ideia de acordos de livre comércio que Montevidéu negocia com China e Nova Zelândia. O chanceler brasileiro, Mauro Vieira, por exemplo, afirmou em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo que tirar uma ideia como essa do papel significaria a destruição do Mercosul.

O centro-direitista também disse que “não é necessário ser de esquerda para defender a democracia”, contrariando falas do presidente da Argentina, Alberto Fernández, e de Lula, em Buenos Aires. O contexto era a cúpula da Celac (Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos), em janeiro, que incluía a participação do líder da ditadura cubana, Miguel Díaz-Canel. Na ocasião, Lacalle Pou afirmou que nem todos ali respeitavam os valores democráticos e que era perigoso fazer da Celac um clube ideológico.

Boric, por sua vez, condena os regimes autoritários tanto na Venezuela quanto na Nicarágua, liderada pelo ditador Daniel Ortega. Em março do ano passado, à BBC, disse que o chavismo é uma experiência que fracassou, “e a principal demonstração de seu fracasso é a diáspora de 6 milhões de venezuelanos”.

Ao assumir a Presidência chilena, tampouco convidou Ortega nem Maduro, assim como Díaz-Canel. Neste ano, seu governo anunciou a concessão de nacionalidade a ex-presos políticos da Nicarágua expatriados, e a chancelaria do país disse que “a defesa da democracia e dos direitos humanos transcende conjunturas políticas e forma parte dos pilares civilizatórios essenciais de uma sociedade”.

Ricardo Della Coletta/Renato Machado/Folhapress

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